Enrique Dussel. Ética Comunitária. Petrópolis,
RJ: Vozes, 1987. 2ª edição (1ª edição 1986) [Coleção teologia e libertação,
série III: a libertação na história]
Helmut Renders
Introdução
Proposta: “Ética social” de ponto de
vista da TL
Organização: parte I: o fundamental, a
partir do mais importante e simples para o mais fundamentada e complexo; parte
II: questões atuais na luz da fidelidade ao evangelho
Observação: Base teórica com empréstimos tomistas (Tomás de Aquino) / parecido com Leonardo Boff;
Parte I:
Dez questões fundamentais
Capítulo I:
Práxis do Reino
Repetição do primeiro capítulo
a partir de conceitos guias de Jung Mo Sung: sentido – desejo – horizonte
utópica
Estado
da questão
Observação: partido do texto bíblico (!); no
caso, da Práxis dos Apóstolos 2,
42-47:
Essência da vida cristã: = práxis; = comunidade [koinonía] estar junto com os outros (mal-entendimento institucional ou eclesiástico possível);
(Na AL as “marcas
da igreja = Atos 2, 42-47; na história = Credo Nicaeno-Constantinopolitano:
unidade, catolicidade e apostolidade da igreja ”)
Essência do Reino = estar junto a Deus;
Práxis como ato relação.
Práxis e prático
= 1º o ato humano que se dirige a outra pessoa humana
ou a maneira atual de estar a frente ao outro
= 2º a própria relação de duas o mais pessoas
Distinção: praxéis [=relação pessoas-pessoa] =
operare porque não colaborare?] não é póeises [ = relação
pessoas-natureza] = facere, fazer, produzir com ou em
algo]
A
pessoa: rosto, corporeidade e o “próximo”.
Pessoa:
Uma pessoa é somente pessoa quando está ante outra
pessoa;
Relação pessoa=-pessoa; o “face-a-face” de duas ou
mais pessoas é ser pessoa;
Pessoa é carne, todo homem, e a encarnação é a
realização de estar frente-a-frente, de construir a proximidade: o outro se
torna próximo;
Práxis = atualização da
proximidade = da experiência de ser próximo para o próximo = de construir o
outro como pessoa = fim da minha ação = respeito infinito (em vez de meio) (?);
A
relação como “agápe”.
Distinção: Agápe (amor do
outro diferente / expressão máxima amar o inimigo) em vez de Éros (o outro como
meio do meio gozo) e filía (amor entre iguais).
O
“nós” do face-a-fasce: a comunidade.
Amor cristão algo comunitário, plural, mediante de
caridade e justiça
Amor-justiça = amor benevolente = mútuo
Da multidão (oxlós,
polloí), mediante do face-a- face da unidade, transforma-se em comunidade (koinonía); na comunidade todas são
pessoas-para-pessoas;
Individualidade se realizando
plenamente na plena comunicação comunitária (Talvez
Habermas: sociedade comunicativa!?)
Comunidade
“eucarística”
Comunidade = fundada no
mútuo amor-de-justiça de participantes livres e plenos
como pessoas = celebração da vida plena;
Eucaristia envolve pão = fruto do trabalho e combina a
relação pessoa-pessoa como pessoa-natureza;
Eu-caristia = a boa oferenda (cháris = ação de graça)
Ao outro se da o fruto da produção = relação
prático-produtiva = uma economia;
Partir o pão = ter todo em comum;
Necessidade,
satisfação, festa.
Práxis como ação e relação =
visa a sua realização integral e felicidade plena; receber segundo a
necessidade = garantir a vida; não ter necessidade critério do juízo final;
O comer junto = festa e
antecipação do Reino;
O
“Reino de Deus” como face-a-face absoluto.
Reino = realização total do
ser humano, positividade absoluta, infinita e irreversível; no primeiro lugar
ser pessoa; Jesus proclama o Reino, é morto mas promete um substituo, o
Espírito Santo;
O
Reino como “já” na comunidade “comunidade”.
Jesus – Espírito: preparação da segunda vinda como
tempo da igreja;
A própria comunidade (teologia católica) a
própria vida comunitária (teologia protestantes)
era “já” o Reino;
O
Reino como “mais-além”: a utopia.
O Reino = anunciado (em Jesus), realizado em parte (em
todo ser humano de boa vontade, mas de forma privilegiado) na comunidade cristã
de base guarda sempre um momento constitutivo do “ainda-não”; O Reino é
transcendência absoluta de toda práxis, de todo face-a-face histórico, de toda
comunidade e um “mais-além” da toda realização humana;
Reino como realidade = algo mais que eu posso praticar
Reino como categoria = horizonte crítico
Reino, historicamente, = uma promessa;
Reino, uma transcendência
escatológica, = princípio absoluto, medida do todo projeto histórico, seja ele
reformista ou revolucionário (observação: reformista = restaurativo aqui;
restauração / status quo – reforma / revolução)
Conclusões
Princípio radical da ética cristã e comunitária;
Capítulo
II: Maldade e morte.
Estado
da questão
Reino = felicidade, realização, santidade = o
face-a-face das pessoas entre sim e com Deus
Maldade / Mal = interrupção, ruptura, impedimento
deste face-a-face. (observação: o conceitos justiça /
shalom representam uma idéia parecida)
O mal passa pela dominação do
outro, substituída pela relação eu-coisa, sujeito-ojeto em vez de
sujeito-sujeito, resultando numa “coisificação” e aniquilação do outro;
O que
é a maldade o mal?
Mal como práxis perversa: 1º =
negação do outro e coisificação e instrumentalização do outro; a denominação do
outro antecede a ofensa de Deus; o Cristo pobre = relaciona o que fazemos ao
irmão pobre um fazer a Deus;
Idolatria,
fetichismo.
Negando o outro o pecador se totaliza, afirma-se como
Deus, fetichiza-se, diviniza-se, idolatra-se e força a ser idolatrizado; o eu
mesmo como Deus;
Já o esquecimento do outro é
roubo: hoje, o capital tornou-se Deus, é idolatrada quando sacrifica a vida do
próximo; Os deuses modernos representam o “pecado moderno”.
Maldade
individual ou abstrata.
Comparação do mito de Gêneses
1 e do Prometeu: não a tragédia, não Deuses injustos, mas o mal-uso da
liberdade cedida contra o outro origina o mal: a queda do ser humano e fruto da
sua própria livre vontade, não imposição divina; duas expressões: o ser humano
relaciona-se como o outro ou como dominador ou dominado e cria-se sistemas de
responsabilidade opressoras;
Pecado
social ou concreto.
O pecado individual é
abstrato, porém, o pecado é cometido em relação ela é institucional = “conforme
o modo de os indivíduos se
comportarem de maneira estável e relacionada”; o domínio estável do outro é
institucional por estabelecer um tipo de relação social estável;
O
pecado “hereditário”
Distinção inicial entre Agostinho e Pelágio:
Pelágio = o pecado é herdado comportamentalmente (observação: escola antropológica);
Agostinho = o pecado é constitutivo para o nosso “ser”
(observação: escola ontológica);
Ser = ser social; o pecado expressa-se no ser
dominador ou ser dominado = desprezar o outro; cada pessoa que chega na idade
que possibilitaria a liberdade efetiva (psicologicamente na adolescência), ela
já é inclusa no sistema pelo papel social, pela classe social, etc.
“O pecado é transmitido pelas
instituições, estruturas culturais, políticas, econômicas, religiosos, eróticas
etc.” por eles herdamos uma práxis equivocada (observação:
Tillich chama isso a tragédia do pecado).
O
“pobre”.
Pobre = ato principal dele não
é não ter bens, mas o “estar dominado”; a alienação do outro (fruto da práxis
do pecador) produz assim a pobreza do pobre (fruto do pecado);
A
“morte”.
A causa da morte eterna é a
vida que vive da morte do outro, do pobre; (muitos
textos bíblicos, pouca argumentação consecutiva).
Consciência
e responsabilidade.
Pecado como herança da relação social não impede nem
consciência do pecado nem a noção da (ir) responsabilidade em relação a práxis
alienadora;
Apesar de que cada um assume o
seu lugar no sistema do pecado num processo não sempre consciente, há
conscientes atos de afirmar e reafirmar o poder, o gozo, a cultura; há uma autoconsciência
na humilhação, no desprezo; A afirmação é responsabilidade, reafirmação
(observação: e re-justificação do direito domínio, do
não-direto da revolta); a consciência se
manifesta pela permanente necessidades de auto-justificação e pela busca de
des-culpas;
O
“Príncipe desse mundo”.
O pecado é não apenas individual ou social, histórico,
institucional, relação social, mas organiza-se, tem consciência de si, funciona
como sujeito: Satã, o “Poder”, o maligno; importante não é objetivação desse
mal num espírito puro substantivo e pessoal – fato que não negamos – mas a
compreender a sua práxis: a dominação do outro (ser senhor do outro alienado);
Pecador, o “rico” = enviado
pelo “Príncipe deste mundo” para institucionalizar seu reinado = estruturas
históricas do espaço como “relação social”;
Conclusão
Maldade e morte descreve o
oposto de Práxis e Reino: = impedimento da construção de comunidade por afirmar
a individualidade contra essa comunidade em vez da realização mútua da
autêntica individualidade e comunidade; a anticomunidade da individualidade
fetichza a individualidade, destrói-se mediante da morte do pobre; (observação: que falta aqui (ainda?) é o perigo do
totalitarismo, o impedimento da construção da individualidade pela comunidade).
Capítulo III: Moral “social” vigente: o
“princípio babilônico”
(Observação: essa
parte é muito parecido a palestra do palestrante de Chicago, na SET 2005:
“Lutar contra o espírito do império”).
Estado
da questão
O mal, o pecado – individual subsumido no social - organiza-se e
institucionaliza-se;
Distinções
necessárias.
O autor estabelece uma distinção fundamental para seu
discurso:
Moral (latim) = sistema prático da ordem vigente e
estabelecida (Observação: discurso do status
quo), justificando o sistema;
Ética (grego) = futura ordem libertadora, exigindo
respeito ao pobre:
Corresponde a essa distinção.
Social = ordem vigente, condição do ser humano.
Comunidade, comunitário = ordem futuro do face-a-face
segundo o amor-justiça; ordem utópica que permite criticar a ordem social
vigente (razão do título: ética comunitária);
Qualquer práxis pode ser boa
para o moral vigente ou para uma ética libertadora;
“Este
mundo”.
Definição: Mundo, cosmo,
ordem, um universo com certa ordem totalizada, fetichizada, fechada sobre
sim;
A
“carne”.
Definição: Carne aqui não
corporeidade ou lugar de onde nascem os desejos, mas também uma ordem, ordem “natural”
do ser humano, o aspecto passional e subjetivo onde se exerce o império do
mundo; o ser humano como “carne” segue ativamente da ordem do mundo, do
império;
O
“Princípio-babilônico”
Totalidade da estrutura das
práticas do pecado; fisionomias históricas diferentes: Egito, Babilônia, (falta Roma); característica = o sistema fecha-se sobre si
mesmo, seu projeto histórico se sobrepõe ao projeto histórico da humanidade, do
humano; suas leis tornam-se naturais, suas virtudes perfeitas, os que re-sistem
se torna terroristas;
O
sistema de práticas mortais.
Cada sistema estabelece suas
práticas como boas: a perversão é agora bondosa e justa; acompanhada por uma
ideologia como encobrimento da realidade dominadora justificando a sua práxis
como se fosse o próprio Reino de Deus;
Moralidade
da práxis.
Moralidade define-se sobretudo
como relação existencial com a norma ou
a lei estabelecida; a moralidade carece um critério de lei justa, do imposto
justo, do salário justo etc. O sistema critica menos o ladrão que rouba (por
ser ainda mal integrada no sistema, o por se mal integrar no sistema) e mais o
profeta que questiona por que se deve seguir e amar a lei desse mundo;
Consciência
“moral”.
O mundo, a cultura informa a
consciência moral dos seres humanos em seu alcanço; classicamente, essa
consciência moral afirma o comprimento das leis em vigor(não roubar etc.), mas
não leva a análise das injustiças encobertas pelo sistema (sofrimento do pobre
é eticamente menos relevante do a defesa da propriedade pessoal); a consciência
moral traz a consciência tranqüila dos que participam no sistema;
O
pobre por “natureza”.
Duas teologias nefastas:
1ª: Segundo a “ordem do mundo” escravos e pobres são
isso por natureza (estão, ordem da criação), são
isso pela vontade de Deus;
2ª: A idéia de uma reconciliação entre ricos e pobres
sem perdão, que passa pelo reconhecimento da culpa e pela reparação
(repartilhação) justa;
Quem defende a pobreza como
algo natural (divino) ou promove a reconciliação antes do odiar do mundo e
fazer justiça pratica uma teologia de dominação;
A
cruz como efeito da repressão do pecado
Ao lado dos pobres sistemas idólatras sacrificam
também os profetas; sistemas que compreendem o perigo de um golpe mortal contra
as suas práticas morais e sua justificativa, atacam o denunciante para que a
consciência da massa oprimida não se torna algo incontrolável;
Nesse caso sistema, na defesa
do status quo, usa toda força para eliminar o profeta e deconstruir o seu
discurso; (falta aqui a
percepção que o sistema, normalmente, primeiro tenta de comprar o profeta);
Conclusões
O pecado não e somente
individual, mas tem sua forma concreta e histórica: tem seu princípio
transcendental (o príncipe desse mundo), um princípio imanente na história (o
império) e seus reis e seus anjos (todos os ricos).
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